Crítica: O Rio do Desejo

Uma imersão intensa na paixão e seus limites

Um mergulho sensorial no desejo, na traição e na intensidade da amazônia

“O Rio do Desejo”, do cineasta Sérgio Machado, nos leva de volta à sua antiga assinatura cinematográfica: um cinema mais sensorial, de atmosfera densa e quente, onde o amor, o desejo e os conflitos humanos se desdobram sob o calor abrasante da Amazônia. Aqui, o diretor ressurge com uma narrativa que não apenas emociona, mas também nos embriaga com seus sentidos. Baseado no romance de Milton Hatoum, o filme explora os meandros de uma paixão proibida e as consequências de desejos reprimidos.                                                                                                                               

A história é simples, quase clássica: Dalberto, interpretado por Daniel de Oliveira, se apaixona por Anaíra (Sophie Charlotte), uma mulher de passado misterioso que, por sua vez, acaba se envolvendo com seus dois cunhados. A trama se passa às margens do Rio Negro, no coração da Amazônia, e é evidente o quanto a geografia e os elementos naturais se tornam personagens vivos dentro da narrativa. Machado, que sempre soube como explorar os espaços com cores vívidas, novamente usa a paisagem amazônica a seu favor, imergindo o espectador em uma imersão quase tátil – sentimos o calor, o cheiro da terra, a umidade da floresta, a tensão nas águas do rio.

Essa abordagem sensorial é, sem dúvida, o maior acerto do filme. A fotografia de Adrian Teijido, consegue traduzir em imagens o tumulto emocional de seus personagens. Em cenas à luz de velas ou com o pôr do sol banhando os corpos suados dos atores, a natureza não é meramente cenário, mas uma extensão dos sentimentos humanos que borbulham no filme. A selva amazônica é quase uma metáfora para o desejo latente de cada um dos personagens, tornando o “Rio do Desejo” uma metáfora visual de anseios reprimidos e traições a serem cometidas.

A performance dos atores principais merece aplausos, Daniel de Oliveira entrega um Dalberto que transita bem entre o homem apaixonado e o policial atormentado. Porém, são Gabriel Leone e Sophie Charlotte os que realmente brilham no filme. O ator, sempre convincente, dá vida a Armando, o irmão caçula que se vê seduzido pela cunhada, enquanto Charlotte, com sua presença magnética, interpreta Anaíra com uma sensualidade que transborda da tela. Mas, embora a personagem de Charlotte tenha um certo potencial para ser mais complexa, o roteiro acaba não aprofundando o suficiente seus dilemas internos, deixando a atriz limitada ao papel da mulher desejada. 

“O Rio do Desejo” se revela uma experiência cinematográfica intensamente sexual. A trama se destaca pela sua abordagem corajosa de temas como traição, amor e desejo. E fica claro que Sérgio Machado é um diretor que sabe como explorar a essência de sua história e como captar uma atmosfera imersiva. A trama pode não ser perfeita, mas ela é, sem dúvida, capaz de conquistar a atenção do espectador, nos lembrando do que o cinema nacional tem de melhor: a capacidade de nos transportar, de nos envolver em suas emoções e, quem sabe, até de nos fazer desejar mais.

Por: Carolinne Macedo (crítica de cinema do Sinopse e do jornal Primeira Página)